sábado, fevereiro 28, 2009

A teia da vida colectiva

D. Quixote e os carneiros - Júlio Pomar

Odeio os indiferentes. Como Frederico Hebbel, acredito que ‘viver é tomar partido’. Não podem existir apenas homens, os estranhos à cidade. Quem verdadeiramente vive não pode deixar de ser cidadão e partidário. Indiferença é abulia, é parasitismo, é covardia, não é vida. Por isso, odeio os indiferentes.
A indiferença e o peso morto da história. É a bola de chumbo para o inovador, é a matéria inerte na qual freqüentemente se afogam os entusiasmos mais esplendorosos.
A indiferença atua poderosamente na história. Atua passivamente, mas atua. É a fatalidade, é aquilo com o que não se pode contar; é aquilo que confunde os programas, que destrói os planos mais bem construídos. É a matéria bruta que se rebela contra a inteligência e a sufoca.O que acontece, o mal que se abate sobre todos, o possível bem que um ato heróico (de valor universal) pode gerar, não se deve tanto à iniciativa dos poucos que atuam, quanto a indiferença de muitos. O que acontece não acontece tanto porque alguns o queiram, mas porque a massa de homens abdica de sua vontade, deixa de fazer, deixa enrolarem os nós que, depois, só a espada poderá cortar; deixa promulgar leis que, depois, só a revolta fará anular; deixa subir ao poder homens que, depois, só um sublevação poderá derrubar.
Os fatos amadureceram na sombra porque mãos, sem qualquer controle a vigiá-las, tecem a teia da vida coletiva, e a massa não sabe, porque não se preocupa com isso. Os destinos de uma época são manipulados de acordo com visões restritas, os objetivos imediatos, as ambições e paixões pessoais de pequenos grupos ativos, e a massa dos homens ignora, porque não se preocupa. Por isso, odeio os indiferentes.

Antonio Gramsci, do livro «La Città Futura» (tradução brasileira)

1 comentário:

Anónimo disse...

“O maior castigo para aqueles que não se interessam por política é que serão governados pelos que se interessam”

AToynbee

A.